Ontem a Al-Qaeda ofereceu mais um dos seus "presentes" à Arábia Suadita, com a explosão de um carro armadilhado junto ao ministério do Interior, em Riade. Lembro-me de ter lido nas notícias, há já algum tempo, que em Fevereiro do próximo ano irá realizar-se, exactamente na capital da Arábia Saudita, uma conferência internacional para discutir o problema do terrorismo.
Ora, há aqui qualquer coisa que não bate certo. A Arábia Saudita é um país em que os seus governantes simpatizam abertamente com algumas das ideias típicas de grupos terroristas e patrocinam fortemente a expansão a nível mundial do wahhabismo, a versão mais radical do Islão. A que os taliban impunham no Afeganistão. Essa mesma.
Assim sendo, como é que se vai discutir - sem rodeios - o terrorismo, na Arábia Saudita, sem pôr em causa a ideologia que sustenta o próprio regime?
É tão surrealista como imaginar uma conferência sobre direitos das crianças, na Coreia do Norte, ou sobre liberdade de imprensa, em Cuba ou no Zimbabwe.
É costume ver tratados nas notícias factos cujas denominações são, muitas vezes, aligeiradas. Noutros casos, dá-se-lhes um nome bem distinto do que são na realidade.
Veja-se o caso do Iraque. Todos os dias há ataques à bomba. A maioria contra civis, como foi o caso de dois dos últimos atentados, cujos alvos foram pessoas perto de duas mesquitas, em Kerbala e Najaf. A isto se chama "acções da resistência". Há poucos dias, na BBC World verifiquei que aos autores destas acções se chama insurgents. Insurgent (insurgente, em português) quer dizer insubmisso, que se subleva.
As nossas televisões, em especial a RTP e a TVI, chamam-lhes tão simplesmente "rebeldes". Ora, rebelde e insubmisso é o que os pais normalmente chamam aos filhos que "saem da linha". Não creio que teimosia juvenil e ataques à bomba possam ser chamados da mesma maneira. Esses ataques são TERRORISMO. Puro e simples.
Mesmo o ataque há dois dias contra uma base americana em Mossul é terrorismo. Por muito que se possa discordar da invasão e da ocupação americana no Iraque, nem tudo é válido para lhe pôr fim. Os fins não justificam todos os meios. E é preciso não esquecer que os fins de Zarqawi, o "rebelde" jordano da al-Qaeda que lidera a "resistência" no Iraque, não são a paz, a democracia e a estabilidade. Não estamos a falar de imitadores dos franceses ou dos gregos que atacavam os nazis na II Guerra Mundial. Estamos perante criminosos que apenas procuram espalhar o terror e o caos.
O mesmo em relação ao Médio Oriente. Aos ataques de bombistas suicidas palestinianos contra autocarros, discotecas, mercados, restaurantes ou pessoas à saída de sinagogas chama-se "resistência". Os bombistas são "activistas" ou "militantes". No extremo, "radicais".
Não aceito este aligeirar das coisas. Em assuntos e factos bem menos sérios empregam-se os nomes mais graves. Aqui parece preferir-se um pretenso politicamente correcto ou um suposto distanciamento em relação às partes. Ou então é uma atitude de compreensão ou mesmo simpatia para com algo que eu não sou compreensivo. E muito menos simpático.
Nas próximas eleições legislativas é quase garantido que o poder vai virar à esquerda. PSD e PP, apesar de irem às urnas separados já prometeram retomar a coligação, se juntos garantirem uma maioria de "centro-direita", como actualmente.
Santana Lopes e Paulo Portas até assinaram um compromisso de "casamento" pós eleitoral em frente às câmaras. Sócrates chamou a isto uma "união de facto".
Pelo contrário, o PS e o Bloco não vivem em união de facto, mas é certo que namoram e o casamento adivinha-se. Não o fazem ás escondidas, mas também não trocam anéis de noivado nem caixas de bombons ou ramos de flores.
Já o PCP parece que nesta história é o cônjuge que tem de sair de casa com o divórcio já anunciado por José Sócrates, que excluiu uma coligação entre socialistas e comunistas se não houver maioria absoluta para o PS.
Tanto no caso Santana-Portas como no Sócrates-Louçã estamos perante casamentos forçados, apesar das conveniências. Santana e Sócrates, cada um para seu lado, bem preferiam ficar "solteiros". Já Portas e Louçã, cada um com o seu prometido, esperam impacientes pela hora de dar o nó. São eles quem mais tem a ganhar.
O namoro e o noivado ainda agora começaram. Vamos ver que no dia das eleições vai mesmo ter de dizer o "sim". Quem perder a 20 de Fevereiro vai assumir o papel de madrasta maléfica que faz a tudo para separar o casal.
Quem ganhar recebe como casa - e que casa! - um país para governar. Com uma longa colecção de mobílias e presentes, alguns estragados e já fora da garantia, usados por anteriores casais e solteiros negligentes.
Estamos todos convidados para a boda. Só espero que no fim da festa não apanhemos uma grande dor de barriga. E que os que se chegarem a casar que sejam felizes para sempre. Ou seja, que o casal consiga durar quatro anos.
Há poucos dias, dois funcionários da Câmara Municipal de Almodôvar (Baixo Alentejo) pretendiam livrar-se de um cão vadio. Como não o conseguiram enxotando o animal, resolveram enforcá-lo numa árvore próxima.
Mesmo assim, o animal ainda custou a morrer e "para lhe acabar mais depressa com o sofrimento" - benditas almas caridosas - acabaram de o matar à paulada. Tudo isto à vista de crianças de uma escola vizinha.
A autarquia anunciou que vai accionar os meios legais para punir os dois funcionários. No entanto, a sanção disciplinar não deverá passar de uma "advertência escrita".
Desculpem-me o português, mas não me contenho. PAÍS DE MERDA o nosso, cujas instituições deixam passar com uma mera nota de rodapé, um acto de brutalidade desta dimensão. Bem sei que há crimes que se cometem contra pessoas que muitas vezes se deixam passar sem o mínimo de justiça, e isso é ainda mais indigno.
Mas também acredito que o nível de civilização de um povo se mede em grande parte pela maneira como se tratam os mais fracos e os que não se podem defender, incluindo os animais. Além do mais, pendurados pelo pescoço.
Aguarela de Roque Gameiro representando a expulsão dos Judeus de Portugal.
O Édito de Expulsão foi promulgado por D. Manuel em 5 de Dezembro de 1496. Há 508 anos.
Para melhorar as relações com Espanha, o rei D. Manuel pretendia casar-se com a filha dos Reis Católicos. Como condição para aceitar o casamento da filha, Isabel e Fernando exigiram que expulsasse todos os Judeus de Portugal (como eles haviam feito em 1492). Na altura do decreto de expulsão de Espanha, milhares de judeus (93 mil segundo as contas do contemporâneo Andrés Bernaldez) atravessaram a fronteira em busca de abrigo, mediante o pagamento de um tributo de 8 cruzados por pessoa e a licença de trânsito por oito meses atribuída pelo rei D. João II.
Os que não puderam pagar a quantia viram-se numa situação de servidão. A estes foram retirados os filhos menores, que foram baptizados e entregues à guarda de Álvaro de Caminha que nessa altura partia para o povoamento da ilha de São Tomé, onde a maioria não resistiu às condições do clima.
Uma vez que os Judeus constituíam uma parte importante da elite económica, cultural e científica do país, o rei queria evitar a sua fuga. Para o conseguir autorizou a permanência no país àqueles que aceitassem a conversão ao cristianismo. Com a proibição de entrar em Castela, a única saída era por mar. No entanto, o rei não aprontou os barcos para o embarque e se, inicialmente, haviam sido facultados três portos para o embarque, apenas Lisboa ficou disponível. Enquanto esperavam autorização de saída foram baptizados à força os que o não tinham sido de livre vontade.
Surgiu então uma nova classe: os cristãos-novos. Tornaram-se o alvo preferencial da Inquisição que seria estabelecida em 1536, uma vez que muitos continuaram a praticar secretamente o Judaísmo. Mesmo depois da abolição do Tribunal do Santo Ofício, em 1821, o cripto-judaísmo continuou a ser praticado em Portugal, em especial na Beira Interior e Trás-os-Montes. Em Belmonte, só terminaria já depois do 25 de Abril.
«Andem estes mal baptizados tão cheios de temor desta fera [a Inquisição] que pela rua vão voltando os olhos [para ver] se os arrebata, e com os corações incertos, como a folha da árvore movediça, caminham, e se param atónitos.»
Samuel Usque, Consolação às Tribulações de Israel, Diálogo III, Cap. 30, 1533.
Algumas mentes pensantes dizem que Sampaio resolveu decidir-se pela dissolução da Assembleia da República e assim acabar com o governo de Santana Lopes, depois da publicação de um artigo de Cavaco Silva no Expresso.
Nesse artigo, o antigo PM com grandes ambições (ainda não declaradas) a alcançar o lugar de Sampaio, apelou aos políticos competentes para afastarem os incompetentes. Alguns viram aqui uma (in)directa para Santana.
E terá sido isto que fez acordar o Presidente.
Ora, se assim foi, estamos mal (ou seja, pior ainda do que pensávamos). É que isso quer dizer que além de um governo que não governa, temos um presidente que não preside. Limita-se a ficar à espera que alguém lhe dê umas dicas como agir.
O que não é mais que a cenoura na ponta do pau que faz andar o burro.
O Presidente decidiu. Para uns tarde, para outros cedo. Para outros ainda devia ter estado quieto. Assim, vamos mesmo ter eleições antecipadas. Em democracia não costuma haver vencedores antecipados, mas, ou muito me engano, ou vamos ter de levar com Sócrates mais uma vez... Sim, mais uma vez.
Para os esquecidos, ele foi ministro de António Guterres. E o seu registo não foi lá muito brilhante. No currículo dele estão políticas como a co-incineração dos resíduos industriais nas cimenteiras - que acabou por não ir para a frente, não pelos protestos populares, nem pela opção por medidas mais amigas do ambiente, mas porque Guterres resolveu saltar do poleiro depois do desaire socialista nas últimas autárquicas. E dos governos guterristas não nos ficou grande herança. Conseguiram o prodígio de emagrecer a vaca, mesmo em período de vacas gordas. É o nosso crónico contra-ciclo.
Pelo que fez como ministro e pelo que tem feito como líder da oposição, José Sócrates não merece ser Primeiro-ministro de Portugal. É verdade que Santana Lopes foi um desastre à frente do governo, que quebrou as medidas de austeridade do governo de Durão Barroso e emprenhou-se em populismos, que vão contra o rigor que o país deve prosseguir. É verdade que o seu governo e o de Durão Barroso estiveram reféns de Paulo Portas - a actual 'bruxa má' da política nacional.
Então e Sócrates, garante-nos algo de diferente? E diferente para melhor? Até agora, em poucos meses de liderança socialista, não se vêem grandes diferenças. A mesma figurinha a puxar para o mediático, bon vivant que tanto se critica em Santana Lopes. O mesmo estilo light e teatral. No seu caso, ainda mais dramático.
As últimas sondagens - valem o que valem, a 3 ou 4 meses das eleições, mas é o que temos - mostram que o PS está 11% acima do PSD, e sem maioria absoluta. Isto quer dizer que, se o PS não conseguir uma maioria absoluta, vamos voltar aos famosos orçamentos limianos da era Guterres. Ou, pior ainda, em vez de um governo e um país reféns do tradicionalista e em muitos aspectos retrógrado PP, estaremos reféns de um irremediavelmente fossilizado PCP ou do um anarquista-armado-em-revolucionário-progressista Bloco de Esquerda.
Em nenhum dos casos vejo um futuro risonho para Portugal.
PS - No princípio desta noite, quando à hora dos telejornais (o nosso marketing político é oportuníssimo!) José Sócrates fez o seu comentário à decisão presidencial de dissolução da Assembleia da República saiu-se com uma frase notável. «Esta situação tem APENAS UM responsável: o Dr. Santana Lopes e o seu governo.» Ora, está-me cá a parecer que, tal como António Guterres, José Sócrates também tem um problema com a matemática.
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