A ONU tem destas coisas. Ao mesmo tempo que se eriçam os cabelos dos diplomatas com a questão do dossier nuclear iraniano, escolhe-se exactamente o Irão para a vice-presidência da Comissão de Desarmamento das Nações Unidas.
Ora, esta comissão é nada menos que a agência da ONU encarregada de limitar o uso do armamento nuclear no Planeta.
Capice?
Foto: Oded Balilty/AP
Vika Chervinska, 8 anos, espera a sua vez para rebeceber tratamento contra o cancro, amparada pela sua mãe, no hospital pediátrico de Kiev, na Ucrânia. Segundo a Greenpeace, mais de 90 mil pessoas poderão morrer de várias formas de cancro, causado pela radiação do acidente nuclear em Tchernobil, há 20 anos.
Passaram 20 anos, mas o drama de Chernobyl continua hoje a matar.
Em Portugal, hoje como recorrentemente acontece, algumas pessoas insistem no nuclear como alternativa. Com os preços do petróleo em escalada permanente e face à previsibilidade do aumento constate do consumo de energia, a questão do nuclear em Portugal volta à ordem do dia. Qual é o preço a pagar?
Hoje, em Israel, comemora-se o Dia de Memória aos Mártires e Heróis do Holocausto (estranha denominação, a meu ver). Ao som das sirenes, durante dois minutos, cessa o trânsito em todo o país. As pessoas param e relembram as memórias pessoais ou colectivas da tragédia que teve lugar na Europa há 60 anos.
Nos media israelitas, neste dia são contadas novas histórias, dos milhões de histórias individuais da Shoa, dos quais ainda faltarão descobrir e contar muitos milhares. Das notícias sobre o tema no The Jerusalem Post chamou-me a atenção para Many Shoah survivors live in poverty.
Apesar dos milhões pagos em "compensações de guerra" pelos sucessivos governos alemães - a braços com a herança deixada pelos nazis - são muitos os sobreviventes que vivem hoje na miséria. Inclusive em Israel. Com outras prioridades para o país, como a construção de fábricas, estradas, projectos agrícolas ou na defesa, os fundos dos sobreviventes acabaram por ir parar a outras causas que não os seus legítimos destinatários.
Há alguns anos, li um artigo da revista Newsweek que relatava o caso dos sobreviventes que vivem em hospitais psiquiátricos em Israel. Não será coincidência que a maioria dos doentes internados nesses hospitais sejam exactamente sobreviventes dos campos de concentração.
Depois da sua chegada a Israel, poucos anos após o final da guerra, revelaram sinais de "stress pós-traumático", uma patologia ainda sem nome na altura. Incapazes de lidar com estas situações, as autoridades médicas acabaram por decretar o internamento de muitos deles em instituições psiquiátricas.
Só no final da década de 80, mais de 40 anos após a libertação física dos campos, foram descobertos e começou o seu processo de reabilitação e libertação psicológica. Presos nos seus fantasmas de décadas, realmente foi como se só então tivessem saído detrás do arame farpado. São estas as histórias que ainda falta contar.
Publicado ontem no Correio da Manhã. Escrito por Ferreira Fernandes, na sua coluna 'Bilhete Postal':
Um dia especial
Faz hoje 500 anos que uma multidão imbecil tornou Portugal mais pobre. A matança de muitas centenas de judeus em Lisboa (talvez quatro mil) fez o País perder, entre mortos e exilados, os mais cultos e modernos dos seus filhos.
O crime boçal prosseguiu durante séculos. Até ao Marquês de Pombal a "limpeza do sangue" - a prova de ausência de judeus até aos bisavós - era condição para bons empregos. Ao seu ministro Pombal, o rei D. José pediu que decretasse um distintivo obrigatório para quem tivesse sangue judeu. No dia seguinte, ele apareceu com três distintivos ao peito. O rei perguntou a razão. Pombal: "Um por mim, outro pelo inquisidor-mor e outro por Vossa Majestade." Judeus somos, os portugueses, todos um pouco. Ignorantes de nós somos todos muito.
Ontem, 500º aniversário do massacre de Lisboa (1506), durante o qual foram mortos cerca de 4000 Judeus e "Cristãos-novos", realizou-se no Largo de São Domingos, junto ao Rossio, uma pequena manifestação em memória da chacina.
Seguindo o apelo lançado via Internet pelo blog Rua da Judiaria, alguns dos presentes acenderam velas. Interessado em saber sobre cobertura jornalística da manifestação, acabei por descobrir no site Yahoo! News diversas fotos, entre as quais a seguinte.
Ao mesmo tempo, também se juntaram, mas com propósitos completamente distintos, alguns apoiantes da extrema-direita nacional. Enquanto na praça uns acendiam as velas memoriais, outro faziam a saudação fascista. O contraste não poderia ser maior...
Na análise das notícias, também notei na falta de presença de elementos da Comunidade Israelita de Lisboa. Segundo as contas, estavam lá 50 pessoas (incluindo o presidente), de entre os cerca de 1000 membros da CIL. Manifestamente pouco, mas que parece estar de acordo com a regra da sistemática fraca exposição pública da comunidade.
Nota: Para informação sobre o massacre de 1506, com alguns relatos da época (e posteriores), recomendo a leitura dos últimos artigos do blog Rua da Judiaria, de Nuno Guerreiro, o jornalista português residente em Nova Iorque que lançou a iniciativa da recordação activa desta tragédia esquecida pelos manuais escolares e pela maioria dos livros da nossa História.
Ainda bem que há coisas que não mudam neste país. Quando parti para Israel, em finais de Setembro, uma das músicas que fazia furor nas rádios nacionais era a extraordinária "Maria Albertina" dos Humanos.
Felizmente, seis meses depois ainda continua a rodar. Dá gosto.
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