Em Jerusalém é muito comum encontrar pessoas a pedir na rua. De acordo com as estatísticas, esta é a mais pobre cidade de Israel. O que é um paradoxo, pois esta também é uma das cidades mais caras para se viver. A cada ano, os cada vez mais incomportáveis preços das casas, levam milhares de jovens casais a abandonar a cidade para os subúrbios.
Ao mesmo tempo, no Bairro Judeu da Cidade Velha existem alguns dos apartamentos mais caros do mundo. Milionários estrangeiros dispõem-se a pagar centenas de milhares de dólares até por um cubículo sombrio, só para estarem perto do Muro Ocidental algumas semanas por ano.
Os bairros habitados por comunidades de judeus haredim, como Kiryat Zanz, San’hedria, Har Nof ou Mea Shearim, são dos mais sobrelotados da capital e, apesar de estarem entre os mais caros, têm uma boa parte dos seus residentes sustentados por organizações de caridade. Jovens recém-casados têm como alternativa os colonatos de Beitar Ilit, Modi’in Ilit ou Elad. E mesmo esses, dada a crescente procura, já começam a ficar caros para a maioria das bolsas.
Nas ruas dos bairros mais religiosos, dezenas de pessoas, na maioria homens, esticam a mão aos transeuntes, na esperança de receberem algum dinheiro. Nem todos serão necessitados, muitos aproveitam-se da generosidade dos locais e da inocência dos turistas. Os muitos loucos que param por estas bandas vivem do que conseguem juntar com a esmola. Nos tempos mais recentes apareceram e abancaram nas escadas de acesso ao Kotel os vendedores de pulseirinhas vermelhas – a moda cabalista adoptada e publicitada universalmente por Madonna. Cinco shekels, pouco menos de um euro. De euro em euro, se sustenta a barriga ou os vícios.
No Kotel, o Muro Ocidental, tanto na praça como no recinto de orações, abundam os que pedem. Aproximam-se das pessoas que caminham na praça para ir rezar junto ao Muro ou simplesmente dos turistas e vão pedindo: "tzedaka, tzedaka!" (em mau português será algo como "caridade, caridade!"). Pedem não tanto para proveito próprio, mas antes para obras de caridade: yeshivot, cantinas que servem comida aos necessitados, instituições que ajudam jovens casais ou soldados, etc.
As mãos estendidas só se recolhem no Shabbat e feriados judaicos. Nesses dias, existe a proibição religiosa de lidar com dinheiro. Mas a caridade não acaba com a entrada no Shabbat, antes toma outras formas.
Várias famílias religiosas em Jerusalém têm a casa aberta para quem quiser entrar e comer. Um desses casos é o Rav Mordehai Machlis, um rabino americano há mais de 20 anos em Israel. Todas as semanas, abre a sua sala de jantar para dezenas de pessoas: de estudantes de yeshivot aos turistas – nem todos judeus – que já sabem da sua fama e hospitalidade, e vários mendigos que procuram abrigo e uma comida melhor, ao menos no santo Shabbat.
A todos e sem distinção de credo ou condição social, o Rav Machlis acolhe com uma simpatia infinita e com a sua enorme sabedoria. A muitos proporciona a primeira experiência de uma refeição de Shabat, num ambiente religioso.
Apesar de não ter necessidade de ir a casa do Rav Machlis, volto lá de vez em quando. Para lá de um irresistível ambiente louco – imagine-se mais de 50 pessoas desconhecidas apertadamente sentadas numa sala de jantar – da experiência de ter de passar as travessas de comida por cima das cabeças para chegarem até às últimas mesas ao fundo da sala, é comovente admirar o deleite deste homem que, incansável, há anos que mantém a casa aberta, Sábado após Sábado, para dar a algumas dezenas de pessoas, em algumas horas, um pouco da experiência do dia mais santo do ano. Todas as semanas.
Nota: O termo hebraico tzedaka, tem um significado bem mais amplo do que caridade ou esmola. Significa antes de mais, justiça.
Foto: Los Angeles Times
Começou a chuva em Jerusalém. Após o longo Verão, os sinais do Outono já se sentem. O vento frio no final das tardes. O céu cinzento e triste. O tom dourado das pedras da cidade ao pôr-do-sol cada vez menos intenso. As ruas mais vazias de turistas. As ruelas inclinadas e as escadarias perigosamente escorregadias. As árvores da praça do Bairro Judeu da Cidade Velha largam as suas folhas. As camisolas de lã são já imprescindíveis para quem sai à rua.
A neve poderá chegar lá para Fevereiro, um dia ou dois. Talvez nem isso. Se acontecer, não será preciso sequer um nevão para as estradas ficarem bloqueadas. Ainda não tive o prazer de apreciar a Cúpula do Rochedo e a Praça do Muro Ocidental cobertos de branco.
Nos próximos meses vai ser difícil acordar nas manhãs frias e ter atravessar o pátio da yeshiva debaixo de chuva. Na yeshiva, o longo tempo do Inverno é a época alta do estudo. Quando lá fora o clima não alicia aos passeios, o calor do aquecimento central une-se ao "fogo da Torah".
PS – E que este ano se encha o Mar da Galileia!
O preceito judaico mais repetido nas escrituras é: "amarás o converso". É mencionado no Tanach (Escrituras Sagradas Judaicas) mais de 30 vezes.
A admiração pelos conversos e a importante mitzvah (preceito) de os acolher é bem expressa numa passagem da Gemará: Rabbi Elazar ben P’dat disse: "Deus enviou Israel para o exílio entre as nações pelo único propósito de juntar conversos ao seu número". (Talmude Babilónico, Tratado de Pessachim, 87b).
Mesmo que o Judaísmo, apesar das acusações contidas nalgumas passagens dos Evangelhos, nunca tenha tido uma atitude missionária de busca activa de conversos. A atitude judaica deve ser o acolhimento dos interessados à conversão, não a propaganda para que juntem ao Povo de Israel.
Nas palavras do sábio Rabbi Shimon ben Lakish: "O converso é mais querido por Deus que a multidão que esteve perante o Monte Sinai (na entrega da Torah e os Dez Mandamentos). Porquê? Porque essa multidão não teria aceite a soberania de Deus se não fosse o estrondo, os relâmpagos e os trovões e o tremor da montanha, enquanto estes (os conversos) não viram nem ouviram nada do género e ainda assim vêm e submetem-se a si mesmos ao Santo Bendito Seja e aceitam a soberania de Deus! Haverá alguém mais querido que isso?" (Tanchuma Lech Lecha 6).
Há menos de duas semanas, o Jerusalem Post publicou no seu sítio na Internet, o vídeo do assassínio de uma jovem de 16 anos, que teve lugar em Julho, em Gaza. Mais um caso de “crime de honra”. A notícia foi apresentada como um exclusivo do jornal. O vídeo tinha sido obtido pelo jornalista Khaled Abu Toameh, o correspondente do jornal para os assuntos palestinianos.
Porém, em poucas horas, o “furo jornalístico” revelou-se uma mentira. O vídeo era real, mas não havia sido gravado em Gaza, antes no Iraque, em Abril. Uma cilada na qual se via envolvido o mais prestigiado dos jornais israelitas.
Quem entregou o vídeo ao jornalista? A Fatah, o movimento do presidente palestiniano, que controla a Cisjordânia. O jornalista havia sido chamado ao Quartel-general de Informações da Fatah em Ramallah, onde um oficial da Fatah lhe entregou o vídeo e os telefones de duas alegadas testemunhas do assassinato, que iriam corroborar a história.
Descobriu-se depois que as “testemunhas” eram na verdade milicianos da Fatah em Gaza. A história era uma total fabricação. Com que objectivo? Mostrar a Fatah e o governo de Mahmud Abbas como credíveis, parceiros para a paz e lutadores contra as forças do mal representadas pelo Hamas, que há meses controla a Faixa de Gaza, instituindo um estado de terror e não de ordem. A história do assassinato da jovem acabou por ser retirada do site do Jerusalem Post e não foi publicada no jornal no dia seguinte. O ardil montado pela propaganda da Fatah, esse sim, foi revelado.
Na semana passada, o governo de Israel libertou da prisão 87 palestinianos condenados por participação em actos terroristas. Um pormenor que não é circunstancial: todos eram afiliados da Fatah. A acção destinou-se a fortalecer a Fatah e o governo de Abbas na Cisjordãnia, contra o governo do Hamas que controla Gaza.
Esta acção de libertação dos prisioneiros vem sem contrapartidas. A Fatah não tem de dar nada em troca da liberdade dos 87 terroristas. Afinal, nem sequer a televisão palestiniana deixa de passar programas “educativos” anti-Israel. As escolas continuam a ensinar o ódio. Os políticos da Fatah continuam a insistir no retorno dos 4 milhões de refugiados palestinianos, uma ideia que evidentemente resultaria na destruição de Israel.
O governo de Israel sabe de isto tudo. E mesmo assim libertou os 87 terroristas. Apenas para fortalecer a Fatah contra o Hamas. No passado, várias acções de libertação de prisioneiros, por vários governos de Israel tiveram o efeito contrário ao pretendido.
Descobriu-se que mais de 100 israelitas morreram em ataques realizados ou planeados por terroristas que tinham sido libertados da prisão por ordem do governo. O caso mais conhecido foi a libertação do xeque Ahmed Yassin, o paralítico líder espiritual do Hamas. Na altura, a libertação de Yassin destinava-se a enfraquecer e desacreditar Yasser Arafat. Mesmo limitado a uma cadeira de rodas, o diabólico Yassin continuou a instruir milhares de terroristas do Hamas que mataram centenas de israelitas.
Na mesma semana da mentira do vídeo, a Fatah realizou outra acção de propaganda: entregou às tropas de Israel uma série de tubos de metal descobertos próximos de Belém e que, alegadamente seriam usados na construção de mísseis. O caso parece ter causado algum sobressalto em Jerusalém, perante a perspectiva de ataques diários de mísseis à cidade, a partir de Belém, como os que acontecem em Sderot e outras localidades, vítimas dos ataques diários a partir de Gaza. A entrega dos tubos pretendia mostrar o governo de Abbas como um lutador contra o terrorismo. Soube-se depois que afinal os tubos de metal eram exactamente isso: tubos de metal. E que eram usados como brinquedo por algumas crianças.
Se é importante destruir o terrorismo do Hamas, não é menos importante deixar de fortalecer o terrorismo da Fatah. Uns, aberta, os outros, disfarçadamente, desejam o mesmo: apagar Israel do mapa.
Ps – O Hamas e a Fatah têm-se envolvido numa guerra de propaganda que atingiu níveis sórdidos. Ambos reclamam ter vídeos dos outros envolvendo escândalos sexuais. Desde relações homossexuais envolvendo altas figuras do regime, abusos pedófilos numa mesquita do Hamas em Gaza, adultério de líderes da Fatah. Tudo vale para ganhar a confiança da plebe e mostrar que o outro lado é o mau da fita.
Depois dos protestos pela democracia em Rangum, brutalmente reprimidos pela sinistra polícia militar birmanesa, o Mundo parece ter despertado para o drama que há décadas se vive na Birmânia.
Aquele que os ocidentais raramente viam pelas revistas de viagens como um misterioso país de serenos monges budistas e magníficos pagodes dourados, apenas visitado por alguns turistas afoitos e bem recheados de dólares, é na verdade um dos mais terríveis e sanguinários infernos do planeta.
O país é governado por uma sádica "Junta" militar que teima em não aceitar os resultados eleitorais das últimas eleições democráticas que elegeram a líder da oposição Aung San Suu Kyi, sujeita há vários anos a um regime de prisão domiciliária.
Até há umas semanas era apenas mais um dos regimes ditatoriais esquecidos, ou melhor, coniventemente ignorados, como a China ou a Arábia Saudita. Quando o sangue jorra para as câmaras, torna-se difícil manter o silêncio. E virar a cara. Daí as manifs por todo o Mundo.
Manifestação na Malásia
Israel, tal como muitos países ocidentais, tem relações diplomáticas com a Birmânia. Hoje, a par das relações diplomáticas, existem relações económicas, em especial por numerosas empresas de armamento israelitas a fornecerem o regime militar birmanês. É óbvio que Israel não tem o exclusivo da venda de armas à Junta, mas de acordo com a publicação Jane's Intelligence Weekly, "empresas de segurança" israelitas são suspeitas de ter vendido Uzis e partes de espingardas de assalto Galil ao governo de Rangum. Ainda, mercenários israelitas são referidos como treinado a repressiva força policial do regime.
Até aos anos 70, Israel era conhecido entre os estados do Terceiro Mundo como o pequeno país que tinha feito florescer o deserto. Emissários de kibbutzim, as famosas cooperativas agrícolas israelitas, apoiavam projectos agrícolas por todo o continente africano. Depois da Guerra do Yom Kippur, o país abandonou os seus ideais agrários e a presença dos emissários agrícolas enviados pelo estado foi substituída pelas empresas de armamento e os mercenários.
Mercenários israelitas são conhecidos por ter trabalhado a favor de regimes autoritários em Angola, Argentina, Chile, Nicarágua, Congo ou Serra Leoa. A guarda pessoal de Manuel Noriega, ditador do Panamá, era dirigida por Mike Harari, um ex-agente da Mossad. São conhecidas também as ligações dos serviços secretos israelitas à antiga polícia do último Xá da Pérsia. Na Colômbia, o "rei dos mercenários" Yair Klein e seus capangas treinaram os esquadrões da morte da extrema-direita, cartéis de droga e outras organizações de terrível fama, dispostas a pagar milhões pelos seus serviços.
Se comparada com outros apoios, como o da petrolífera francesa Total, que explora campos de gás natural no sul da Birmânia no valor de muitos biliões de euros, é verdade que a parte do apoio israelita nesta equação é ínfima. De qualquer forma, a má fama que dá ao país não é negligenciável. Para lá da ainda mais pertinente questão moral.
O presidente Nicolas Sarcozy terá apelado às multinacionais francesas para congelarem investimentos na Birmânia, como retaliação à violência do regime. Vamos a ver se é só lábia de ocasião. Por enquanto, para a França, o sangue birmanês é mais amargo que o dos africanos, vítimas dos vários ditadores apoiados por Paris. Veremos se a influência da Total não adoça as bocas do Eliseu.
Israel é responsável por 10 a 12% das vendas de armamento a nível mundial. E, é evidente que esses negócios são feitos em virtude do lucro e de algumas considerações políticas. Se por um lado essas empresas com a anuência do governo não fazem, por razões claras, negócios com países árabes ou muçulmanos. Por outro, o governo deixa de ter legitimidade de criticar o apoio de empresas estrangeiras, russas ou chinesas, com o consentimento dos seus governos, a regimes como o Irão ou a Síria. Isto chama-se realpolitik.
Afinal, não existem princípios morais no negócio da guerra. Há interesses, nada mais. Israel faz os seus negócios de acordo com esses interesses e por essa via, perde a face para poder criticar com o argumento da moralidade, outros estados que fazem os seus negócios com os inimigos de Israel.
Custa afirmá-lo, mas no final, o sangue birmanês é tão vermelho como o israelita.
Nota: Estrada da Birmânia é o nome de uma rota construída pelas tropas israelitas, para abastecimento de Jerusalém, cercada por tropas árabes, durante a Guerra da Independência. O nome foi retirado da famosa estrada construída nas montanhas da Birmânia para permitir o abastecimento das tropas que combatiam os japoneses no sudeste asiático, durante a II Guerra Mundial.
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