Quinta-feira, 24 de Julho de 2008

A cópia

Três semanas depois do inédito ataque terrorista com uma retro-escavadora em Jerusalém, o episódio repetiu-se. Um árabe conduziu uma máquina do mesmo género contra automóveis e autocarros. Houve pelo menos quinze feridos, um deles em estado grave. Tal como há três semanas, o autor do ataque era operário numa obra de construção e residente em Jerusalém Oriental. Ambos os terroristas foram mortos por polícias ou soldados armados, no local dos ataques.

Desde o primeiro ataque, foram aumentadas as medidas de segurança nas numerosas obras públicas em curso na Cidade Santa, em especial nos vários pontos da construção das linhas do metro de superfície, que se estendem por toda a cidade. Os bulldozers são agora chamados na gíria “killdozers” ou “escavadoras assassinas”. Por isso, em Jerusalém, em várias obras, as máquinas pesadas deixaram de ser conduzidas por árabes – como era normal até agora – e passaram a ser operadas por trabalhadores judeus.

A maioria dos operários da construção civil em Israel – desde as obras públicas à construção particular, incluindo nos colonatos –, são árabes. Será, muito possivelmente, o principal sector de emprego da população árabe e palestiniana, além da restauração e da hotelaria. Não haverá hotel ou restaurante em Jerusalém sem trabalhadores árabes. No Shabbat, serão mesmo a totalidade dos empregados, desde o recepcionista até ao camareiro. Além disso, a maioria dos árabes de Jerusalém Oriental trabalha na parte ocidental da cidade, onde se situam a maioria dos negócios, restaurantes e hotéis.

Após o ataque de há três semanas, a polícia começou a investigar os registos criminais dos árabes empregados nas obras de construção. Ambos os operários-terroristas tinham registo criminal: um de violação e o outro de consumo de drogas e roubo. Porém, em ambos os casos, esses registos não impediriam, hoje mesmo, que eles fossem aceites para trabalhar numa obra.

Seguramente, muitos trabalhadores árabes da construção civil temem perder os seus empregos. A desconfiança não joga a seu favor. A cada ataque, sobe a suspeita em relação aos árabes em geral. Será injusto generalizar, mas muitos empregadores podem não querer atrever-se a não generalizar. E quem fica a perder, antes de mais, é a população árabe, que depende, na sua imensa maioria, de empregadores judeus para ter o seu ganha-pão.

Nada poderá resultar de positivo – nem para os próprios árabes – após cada um dos ataques, sejam suicidas que se fazem explodir em autocarros ou supermercados, sejam condutores de retro-escavadoras tresloucados. Várias empresas de transporte, hoje empregam exclusivamente judeus. Com empresas da construção civil passa-se o mesmo. Nos jornais, anúncios de venda de casas começam a apregoar que a obra é “mão-de-obra judia”. Apesar de ser mais barato comprar uma casa construída com mão-de-obra árabe, muitas pessoas estão hoje dispostas a pagar mais. Mais do que desejarem que a sua casa seja construída por judeus, desejam que ela não seja construída por árabes.

Também a maioria dos taxistas em Jerusalém são árabes, mas muita gente começa a recusar viajar num táxi conduzido por um motorista árabe. É triste, mas as demonstrações de ódio que provêm do lado árabe são tais, que muita gente simplesmente se recusa, mesmo a um nível mais básico ao nível profissional ou quotidiano, a cooperar com esse outro lado. Não há boas-maneiras que valham quando se tem medo.

Os árabes são a mão-de-obra barata em Israel – como os cabo-verdianos ou os brasileiros em Portugal. No entanto, Israel tem já mais de 200 mil trabalhadores imigrantes não-judeus, metade deste número supõe-se serem imigrantes ilegais. Chineses, tailandeses, filipinos, indianos, cingaleses (do Sri Lanka) ou nepaleses já começam a substituir os árabes nos trabalhos mais pesados.

Se os trabalhadores árabes perderem os seus empregos por desconfiança generalizada dos patrões, o destino de muitas famílias árabes será sujeitarem-se à fome. Ou ao crime. Ou à emigração.

publicado por Boaz às 21:59
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Quinta-feira, 17 de Julho de 2008

O regresso dos mortos

Ontem, Israel e o Hezbollah trocaram prisioneiros. Cinco terroristas que cumpriam pena nas prisões de Israel, assim como os cadáveres de cerca de 200 libaneses e palestinianos que estavam na posse de Israel, foram entregues. Em troca recebeu dois cadáveres. Os soldados Eldad Regev e Ehud Goldwasser haviam sido capturados em Julho de 2006. O seu sequestro às mãos do Hezbollah, enquanto patrulhavam uma área junto à fronteira israelo-libanesa, despoletou a Segunda Guerra do Líbano.


A discrição israelita vs. a pompa do Hezbollah.

Em Beirute, os prisioneiros, os vivos, são mostrados como heróis. O país decretou um dia de feriado nacional. Os caixões dos 200 cadáveres, foram passeados em enormes camiões engalanados. Vivos e mortos mostrados em paradas, sob a bandeira do Hezbollah. Os terroristas xiitas declaram vitória e dominam a vida política do Líbano, sem rival. O governo em peso, assim como dignitários muçulmanos e cristãos, saudaram os ex-prisioneiros, à chegada ao aeroporto de Beirute.

Em Israel, choram-se e enterram-se os mortos. Não há desfiles com os caixões dos soldados. O luto é uma dor privada, reservada às famílias que, até há poucas semanas, ainda tinham esperanças de conseguir reencontrar os seus familiares com vida. Durante dois anos, o Hezbollah manipulou como quis a dor das famílias Regev e Goldwasser, sem saberem nada em concreto do destino dos seus desaparecidos. Eram desaparecidos, até que o próprio governo de Israel os declarou "mortos em combate". As autópsias revelaram que morreram ambos no ataque inicial, na altura do sequestro.

Com esta operação, mediada pelo governo alemão, Israel destruiu três princípios que regiam a sua diplomacia e postura regional: não dialogar com terroristas, não trocar vivos por mortos, não libertar condenados por crimes de sangue. Um dos criminosos libertados, Samir Kuntar, estava preso desde 1979, condenado pela morte de três pessoas, incluindo uma menina de 4 anos. Quase 30 anos passados, nunca mostrou qualquer arrependimento. Agora é um herói em Beirute, junto com Hassan Nazrallah, o líder do Hezbollah.

Ao realizar esta troca, Israel abriu uma série de precedentes perigosos, que motivam os terroristas a continuar as suas acções. Gilad Schalit, o soldado israelita de 21 anos, sequestrado em Gaza em 25 de Junho de 2006, continua em mãos do Hamas. Inspirando-se na troca de hoje, o Hamas pode exigir muito de Israel.

Isto porque, a troca de prisioneiros comprova uma máxima que tem sido uma das regras de ouro da defesa de Israel: nunca abandonamos um soldado. Vivo ou morto, ele deve voltar para casa. Israel mostra uma evidente superioridade moral e humana. A qual, nesta como noutras ocasiões, de um ponto de vista político e militar, pode ser vista como uma fraqueza. Os seus inimigos não terão qualquer pudor em explorá-la. Aí reside o segredo entre o contraste do luto sereno israelita, frente ao alarde dos que celebram um assassino como herói e consciência da nação.

publicado por Boaz às 23:04
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Quinta-feira, 3 de Julho de 2008

Uma luz na selva

Ingrid Betancourt, libertada das garras dos guerrilheiros-traficantes das FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia). A senadora e antiga candidata presidencial franco-colombiana estava sequestrada na selva há 6 anos. Uma boa notícia para a Colômbia.

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publicado por Boaz às 23:24
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Quarta-feira, 2 de Julho de 2008

O elefante e a loja de porcelanas

Hoje houve um ataque terrorista bizarro em Jerusalém. Um homem árabe roubou uma enorme retro-escavadora e decidiu atropelar vários automóveis e autocarros na principal avenida da capital. Morreram quatro pessoas e mais de 30 ficaram feridas, até o terrorista ter sido abatido após alguns minutos, por um soldado. Suspeita-se que o terrorista tivesse a intenção de prosseguir até ao principal mercado de rua de Jerusalém, situado a poucas centenas de metros.

Roubar uma retro-escavadora, de uma obra que estava a decorrer no meio da cidade, e sair desvairado esmagando os carros que passam, abalroando dois autocarros cheios de passageiros, é uma cena digna do Exterminador. Este ataque ultrapassará, não pelo número de mortos, mas pelo modo como foi feito, os limites da demência e do bizarro.

Após cada atentado escutam-se as vozes (poderíamos dizer) mais radicais. Questionam-se o que se deve fazer com os terroristas, as suas famílias, os Palestinianos, e os Árabes de Israel em especial. Os críticos de Israel atacam a construção do muro na Cisjordânia. Chama-lhe muro da vergonha. A verdade é que tão "vergonhosa e monstruosa obra" tem impedido a passagem de centenas de potenciais terroristas.

Actualmente, a questão e a principal fonte de suspeita e medo, não é como evitar que os terroristas árabes da Cisjordânia entrem em Israel. O muro resolve quase totalmente este problema. Agora a questão é: como evitar que os terroristas árabes israelitas, detentores de cidadania, cometam atentados nas nossas cidades?

De fora, os analistas falam de descriminação, estatuto de segunda classe, apartheid em relação aos Árabes, fazendo a comparação com o funesto regime racista que existia na África do Sul. As diferenças, se mais não bastassem, é que os Negros eram excluídos pelos Brancos e o que pretendiam era apenas instaurar um Estado igualitário. No caso dos Árabes em Israel, a maioria auto-exclui-se, sistematicamente boicotando as eleições (sim, os Árabes têm direito de voto, ao contrário dos Negros durante o apartheid da África do Sul) e muitos pretendem mesmo destruir o Estado.

Há 4 meses, após o ataque à yeshiva Mercaz Harav, no qual foram assassinados oito estudantes, surgiram vozes a defender a demolição da casa do terrorista e a retirada da cidadania israelita à sua família. Pais dos alunos assassinados foram até à Knesset, o Parlamento Israelita, defendendo esta medida punitiva. A família, enlutada mas cheia de orgulho, montou uma provocadora tenda de condolências, em memória do seu filho, o terrorista. Penduraram cartazes com o seu retrato sobreposto à imagem da Cúpula do Rochedo. Mais um ícone para a causa. Residentes em bairros de população árabe de Jerusalém Oriental, ambos os terroristas tinham acesso, como qualquer cidadão, a qualquer ponto da capital e do país.

A liderança política dos árabes em Israel segue uma retórica contra o próprio Estado onde vivem. É tal o atrevimento dos políticos árabes locais na sua oposição a Israel que, Azmi Bishara, um dos principais deputados árabes da Knesset, viajou até Beirute durante a Segunda Guerra do Líbano (2006) para se encontrar com Nazrallah, o líder do Hezbollah. Enquanto isso, o Norte de Israel era bombardeado pelos mísseis do Hezbollah. Ironia: a maioria das baixas civis israelitas foram habitantes árabes da Galileia, a população que elegeu Bishara.

Muito poucos dos Árabes de Israel e dos Árabes de Jerusalém Oriental desejam realmente ser cidadãos de um eventual estado palestiniano. Porém, nenhum deles declara os seus desejos publicamente. Nenhum deles quererá perder os privilégios de ser cidadão israelita, ou deixar de usufruir da muito superior qualidade de vida em Israel em relação à Autoridade Palestiniana.

A delicada situação actual de fidelidade ao inimigo e confrontação com o Estado, acompanhada do usufruto do próprio Estado tem de ser definida e resolvida. Os Árabes residentes em Israel terão de decidir em que lado estão. Nenhum país pode aceitar dentro das suas fronteiras, oculto entre os seus cidadãos, um Estado dentro de um Estado. Ainda menos um Estado inimigo que o corrói por dentro. Os israelitas exigem respostas, soluções. Nenhuma delas se afigura branda.

publicado por Boaz às 22:33
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Galeria de imagens da experiência como voluntário num kibbutz em Israel.


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