Israel foi ontem a votos. Uma nação dividida, como muitos órgãos de comunicação social apresentaram a situação pré-eleitoral. Deveria escolher um governo e um parlamento. Porém, na verdade, Israel foi apenas escolher a próxima coligação a dirigir o país.
Há quase duas décadas que nenhum governo consegue governar com uma maioria estável na Knesset, o Parlamento israelita, nunca conseguindo terminar o mandato de 4 anos. Ganhe a esquerda ou a direita, as opções de coligação residem numa miríade de pequenos partidos. Dos partidos judaicos religiosos aos da minoria árabe, da extrema-esquerda aos nacionalistas, do efémero partido dos reformados aos novos ecologistas.
Os resultados (quase) definitivos mostram que o partido Kadima – uma amálgama de gente saída tanto de partidos da esquerda como da direita, formada “à pressão” antes da retirada dos militares e dos colonatos israelitas da Faixa de Gaza em 2005 – obteve o maior número de deputados, 28. Porém, apenas mais um do que o Partido Likud, de direita. Tzipi Livni, antiga ministra dos Negócios Estrangeiros e indigitada chefe do governo após a auto-demissão do PM Ehud Olmert, e Binyamin Netanyahu, líder do Likud e que já foi ele próprio Primeiro-Ministro, cantam vitória.
É uma vitória cheia de riscos para cada um. Apesar da enorme divisão de votos entre muitos partidos, a maioria do eleitorado votou à direita. Daí que será especialmente difícil para Livni formar uma aliança de partidos. ‘Bibi’ Netanyahu, por esta via, tem o caminho facilitado, podendo aliar-se aos vários partidos religiosos.
Em qualquer dos casos, não sairá nenhum governo sem a participação do partido Israel Beiteinu (Israel Nossa Casa), liderado por Avigdor Lieberman, um nacionalista de origem russa com posições radicais. De um partido de, e para, imigrantes russos, o Israel Nossa Casa transformou-se ontem na terceira força política israelita. Com um discurso frontalmente anti-árabe, é a favor de transferência de populações e de territórios entre Israel e um eventual estado palestiniano. Defende a anexação dos principais blocos de colonatos judaicos, e da entrega das cidades israelitas de maioria árabe situadas junto à "Linha Verde", a fronteira reconhecida internacionalmente entre Israel e o futuro estado palestiniano.
O sucesso de Avigdor Lieberman e das suas ideias radicais é o eco político da última campanha militar em Gaza. Israel não conseguiu acabar com o Hamas. O Hamas não parou de lançar mísseis sobre o Sul de Israel. O eleitorado decide-se por quem promete tomar posições de força contra o terror. É uma equação simples, mas os resultados são complicados.
Outra das novidades das eleições é a degradação do voto nos partidos religiosos. O antigo bloco sionista-religioso dividiu-se em dois partidos, cada um a entrar à tangente na assembleia nacional. O Shas, tradicional partido dos judeus sefarditas (judeus de origem ibérica e árabe) perdeu votos entre os seus eleitores menos religiosos, a favor do secular Israel Nossa Casa. Até entre os haredim ou judeus ultra-ortodoxos, houve quem se atrevesse ao "voto livre", em vez de seguir a posição (quase)vinculativa dos rebbes (os grandes rabinos).
Pouco ficou definido nestas eleições. A única coisa garantida no final das eleições é a assunção que o eleitorado israelita está muito dividido e, além do mais, pouco convencido pela retórica dos partidos tradicionais. Na mão de pequenos partidos com agendas muito particulares, é apenas uma questão de tempo, talvez apenas algumas semanas, até que haja novas eleições. No panorama actual, um qualquer governo de coligação não se conseguirá manter, com tantos interesses a ser satisfeitos de tantos lados opostos. A corda é demasiado frágil para poder ser puxada de tantos lados.
Sem quaisquer dotes de profecia, atrevo-me a antever uma nova votação para os tempos mais próximos.
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