Depois de alguns meses numa yeshivá em Israel, para a maioria dos alunos estrangeiros chega a hora de regressar aos seus países. Os estudantes americanos chegam, geralmente, de um ambiente religioso, com famílias observantes e comunidades bem organizadas. Muitos vêm para a yeshivá como alternativa a um ano de estudos na Yeshiva University, uma conceituada universidade judaica ortodoxa dos EUA, em Nova Iorque. O ano que estudam em Israel dá-lhes créditos para o curso universitário e, a anuidade na yeshivá é muito menor que a da universidade, por isso compensa financeiramente às famílias enviar os filhos para Israel.
Com os brasileiros e outros latinos a situação é bem diferente. A grande maioria dos alunos que chegam do Brasil fez teshuvá (tornaram-se religiosos) por via de algum movimento judaico juvenil – em geral o Bnei Akiva. Em alguns casos, esse desvio em direção à observância religiosa não foi acompanhado pelas respetivas famílias. Assim, a hora de voltar é um passo duplamente difícil.
Beit Midrash, o centro de estudos da yeshivá.
A quantidade e variedade de livros é impressionante.
Muitos chegam com um nível básico de hebraico, obtido durante os estudos nalgum colégio judaico. Em termos de conhecimentos de Torá a situação não é melhor. Alguns começaram há pouco a cumprir as leis do Shabbat e da alimentação casher. Apesar de “verdes” chegam com uma ânsia enorme de aprender.
Praticamente nunca tiveram contato com o Talmude, a base de todo o estudo na yeshivá. O choque inicial é enorme. A dificuldade com a intrincada construção das discussões talmúdicas e o obstáculo da língua aramaica – a língua da Guemará, parte principal do Talmude –, significam um avanço lento nos estudos. O “verdinho”, um popular dicionário aramaico-hebraico-inglês, é consultado a cada duas palavras do texto da Guemará.
Nas primeiras semanas, a frustração é evidente em muitos destes alunos. Em conversas com os alunos mais experientes, alguns confessam pensar em desistir. Raramente o fazem. Na yeshivá o tempo passa rápido e uma clara progressão é visível logo ao fim de um mês. Aos poucos, o “verdinho” é posto cada vez mais de lado. A repetição dos termos talmúdicos e a classe diária sobre o assunto em discussão ajudam a entrar na dinâmica da Guemará.
O Shabbat é um dos tempos mais extraordinários na yeshivá. O ambiente de festa, com canções e até mesmo dança durante as refeições festivas deixam uma marca profunda. Com o tempo, alguns dos que viam a sua estadia na yeshivá como algo temporário decidem não regressar definitivamente a casa. Na verdade, decidiram que a sua casa é em Israel e voltar para um ambiente não religioso torna-se impensável.
Para os que ficam, várias questões se colocam: tratar já do processo de aliyá (a imigração para Israel) ou permanecer por enquanto como residente estrangeiro? Continuar na yeshivá mais um ou vários anos, ou sair e ir para a faculdade? E a entrada no serviço militar – agora, ou adia-se mais um pouco?
Mesmo os que saem da yeshivá e tomam algum outro caminho em Israel – exército, trabalho ou faculdade –, mantêm um contacto com o local e os amigos que lá fizeram. Nas horas vagas dos estudos lá fora ou nos dias de licença militar regressam aos bancos do Beit Midrash, a sala de estudos principal. Com frequência passam o Shabbat na yeshivá ou em casa de um rabino ou de um aluno já casado. Todos se reencontram nos casamentos de amigos. E a yeshivá é uma fábrica de casamentos!
Ainda assim, há os que têm mesmo de voltar para os seus países. Para terminar a faculdade que ficou “trancada”. Para o trabalho deixado em pausa. Para a família que insiste que voltem. As semanas que antecedem a partida são de grande ansiedade. A preocupação maior é manter o nível elevado que foi conseguido na yeshivá. Compram livros indispensáveis para continuar os estudos de Torá, livros impossíveis de encontrar fora de Israel (ou quando se encontram à venda são caríssimos!). Estudam como casherizar a cozinha da família, o que se pode ou não pode comer fora de casa, como respeitar o Shabbat quando a família não é religiosa. Fazem-se contatos com rabinos e famílias religiosas nas suas cidades, para que os possam acolher no Shabbat e nas festas.
De volta a casa, uma decisão unânime é dedicar um tempo para trabalhar com kiruv – a ajuda aos jovens judeus para se aproximarem do Judaísmo. (Kiruv significa aproximação, em hebraico). A partilha dos conhecimentos e experiências da yeshivá são uma excelente forma de atrair os jovens para aderir a uma forma de vida comprometida com os valores judaicos.
Em regra, o regresso é apenas temporário. O tempo suficiente para terminar os estudos e ir convencendo a família a deixá-los fazer aliyá. Aquilo que conquistaram com os meses passados na yeshivá é demasiado precioso para se arriscar a deixar perder num ambiente pouco cooperante com a observância judaica.
É um orgulho ver a incomparável metamorfose por que passam os novos alunos que chegam. Como crescem e se desenvolvem humana e espiritualmente. São muitos os milagres produzidos nos bancos da yeshivá.
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